domingo, 31 de outubro de 2010

Soledad



É chegado o tempo da solidão.

O tempo de sentir as paredes da casa comprimindo durante o fim da tarde.
É chegado o tempo das ruas desertas e das amigas distantes... É chegado o momento em que tudo mais parece um dia sem cor.
O tempo dos celulares com bônus exagerados e dos chips que se comprometem a ligar de graça por 31 anos. Nada perdura mais que o ermo e o sentimento de que a voz, de alguma forma, consola. É tempo de se aceitar a solidão como amiga. Conviver com ela com paciência e animosidade.

Como pode se estar agora, nesse tempo, em tempos de solidão?

Meu trabalho é solitário. As pessoas entram na minha vida como uma voz. Ouço-as, mas não as conheço. Sei dos seus dados bancários, mas não as conheço. Se as conhecesse, lhes diria "oi", mas não saberia dos seus medos. Ninguém mais quer ouvir sobre os avós... Não há mais a cadeira na calçada e o tio que contava suas passagens de retirante. Ninguém mais se orgulha das raízes. Ninguém mais quer conhecer o passado mais próximo do seu melhor amigo. Eu nunca posso dividir com ninguém os singelos dias com o meu avô e sua cadeira de balanço.

Ninguém mais quer ouvir as músicas que minha avó cantava.

É chegado o tempo de cantos secretos à noite, de pequenos segredos de parafina, de escondidos gatos sobre o telhado.

É chegada a hora de recolher o pano de chita dos sonhos e fazer com ele o encosto para assistir televisão. A hora de fazer comunhão virtual com pessoas do outro lado do mundo e de se armar para a revolução com mouse, teclado e assinatura num blog de ideias.

É chegada a hora.
Nada mais existe, nem os campos de borboletas, nem os dentes de leão, nem as tardes esculpidas nas montanhas.

Só o mundo inteiro, avizinhado pela casa mais vazia com ecos de esconder alegrias, que habita dentro dele mesmo.
 
 
 
(Jessiely Soares)