quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Felizes... Até certo ponto.



Conheceram-se nos anos 80. Paixão fulminante, daquela que cega. Prova disso é que o namoro começou de forma bem rápida: após duas semanas de paquera.
Depois de combinar com os pais dela, ele obteve permissão para visitar a casa e namorá-la formalmente na sala, seguidos a cada movimento pelo irmão pequeno dela.
Descobriram-se aos poucos, em longos olhares... Perceberam satisfeitos que eram iguais em tudo.
Gostavam das mesmas músicas, dos mesmos shows, das mesmas revistas. Torciam pelo mesmo time. Gostavam do mesmo lado da cama. Da mesma caneca pra café e do mesmo doce de casca de laranja. Tudo era perfeito, tudo facilmente se encaixava.
Casaram-se, como não poderia deixar de ser. E foram felizes, até certo ponto.
A falta de diferenças começara a incomodar. Era sempre assim... Sempre a mesma posição na mesa, o mesmo jeito de fazer amor, as mesmas cores nas paredes. O mesmo horário do beijo, o mesmo horário do jantar, o mesmo programa na televisão. Ele no sofá, ela na cadeira de balanço.
Por um olhar, eles se entendiam.
E não brigavam.
E não se queixavam.
E não conversavam. Eles nunca conversavam.
“...Nós dois temos os mesmo defeitos, sabemos tudo ao nosso respeito...”.
E foi assim, simples.
Na manhã fatídica ela acordou, o olhou, e questionou-se: “O que fiz da minha vida?” Ele abriu os olhos e entendeu exatamente o que ela pensara naquele incomum olhar matinal.
Ergueram-se e o beijo (rotineiro) de bom dia não existiu. Nem o café na caneca marrom que era exatamente igual à dela. Não, nessa atípica manhã ele fez as malas e foi embora. Enquanto ela, observando o carro que se afastava na esquina, cantava sozinha...
“...Nós dois temos os mesmo defeitos, sabemos tudo ao nosso respeito...”.
(Jessiely Soares)

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